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  • Dr. Alexandre Naime Barbosa

Unesp de Botucatu pesquisa soro para picada de abelha, mas burocracia trava teste em seres humanos


Abelha APIS soro Alexandre Naime Barbosa Unesp.png

Medicamento aguarda autorização da Anvisa para ser testado

Leia em: http://pt.slideshare.net/spitalex/projeto-apis-jornal-da-cidade-bauru-sp-07032015

Leia em: http://www.jcnet.com.br/Regional/2015/03/botucatu-pesquisa-sorobrpara-picada-de-abelha.html

Uma pesquisa que teve início há mais de 15 anos na Unesp de Botucatu poderia estar no mercado salvando vidas daqueles que são atacados por abelhas africanizadas. O soro antiveneno venceu as etapas pré-clínicas, aquelas desenvolvidas em laboratório, e aguarda avaliação de dois órgãos federais como Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Comissão Nacional de Ética e Pesquisa (Conep) para ser testado em seres humanos. Sem o teste, o soro não pode ser fabricado e as mortes continuam acontecendo. Dados do Ministério da Saúde apontam que 10 mil casos foram registrados em 2013, sendo que 40 deles ocorreram no Brasil.

Recentemente, um homem de 80 anos morreu dois dias depois de ser picado por aproximadamente 300 abelhas, em uma propriedade rural de Botucatu. Caso o medicamento estivesse disponível, a vítima teria chance de sobrevivência, avalia o médico infectologista e professor da Faculdade Medicina de Botucatu da Unesp Alexandre Naime Barbosa.

O coordenador-executivo do Centro Virtual de Toxinologia (Cevap) onde o soro foi desenvolvido, professor Rui Seabra Ferreira, é enfático em dizer que não existe no mundo um tratamento específico para as múltiplas picadas de abelhas. “Não tem soro antiveneno no mundo. Não sabemos se vai funcionar. Temos que testar, tanto a eficácia como a segurança. Solicitamos uma priorização de análise, eles estão avaliando se pode ser prioridade, visto que morre gente todos os dias de picada de abelha no País.”

Na avaliação de Barbosa, a demora na avaliação dos órgãos acarreta prejuízos incalculáveis. “Essas avaliações poderiam ser feitas em seis meses e se arrastam há dois anos.” Por conta disso, ele diz que o Brasil é extremamente atrasado nas pesquisas clínicas. “Os brasileiros nunca são incluídos nas pesquisas internacionais porque os órgãos regulatórios de avaliação desses projetos em seres humanos é extremamente lentos”. A lentidão nas avaliações não considera nem mesmo o lado econômico do trabalho. “Caso estivéssemos realizando esse estudo, e fosse aprovado, uma das possibilidades era patentear e vender o soro. Gerando recursos às instituições públicas brasileiras.”

A Anvisa foi contatada na última semana para informar o andamento do processo em Brasília, mas até o fechamento desta edição, não respondeu aos questionamentos do Jornal da Cidade.

Pesquisa tem 15 anos e aguarda para ser testada em pacientes

Divulgação

Rui Seabra Ferreira Jr. diz que pesquisa começou em estágio de pós-doutorado

Nem todas as pesquisas produzidas nas universidades chegam ao mercado, ainda que sejam direcionadas a melhorar a vida da população. Isso porque existe um abismo entre a pesquisa básica e a aplicada. A constatação é do coordenador-executivo do Cevap da Unesp, professor Rui Seabra Ferreira Jr. “A dificuldade é mundial. As pesquisas não saem dos laboratórios para o papel. Os pesquisadores publicam e param. O desenvolvimento do antiveneno de abelhas começou há 15 anos e foi evoluindo. Conseguimos montar uma tecnologia para esse novo soro. Isso se deu em um estágio de pós-doutorado meu junto ao Instituto Butantã entre 2006 e 2008.

À época produzíamos esse soro em carneiros para tentar baratear o custo, hoje é produzido em cavalo.” Todo medicamento tem um tempo de 15 a 20 anos de maturação até chegar efetivamente à população. “Como acontece diariamente na universidade, essa pesquisa ficou na bancada. Não avançou, naquela época. Os produtores de soro são quatro no País, não tinham interesse de mudar qualquer tipo de metodologia de produção, mesmo sendo para um produto novo. Eles produzem soro e vendem para que o Ministério da Saúde distribua.”

Em 2010, o Instituto Vital Brasil resolveu apostar nessa ideia. “Mudamos a metodologia para a produção em cavalos e aprimoramos a tecnologia para realização nesse tipo de animal. Por que lá? Porque eles já são uma ‘fábrica’, com toda a certificação para fazer os testes pré-clínicos, toda a parte de produção, a Anvisa reconhece isso. Produzem outros soros. Nós juntos juntamos a eles.”

Em 2012, o professor Benedito Barra Vieira, que é o médico da Faculdade de Medicina, aprovou um projeto junto ao Ministério da Saúde para realizar os ensaios clínicos em pacientes humanos com esse novo soro. Desde então estamos reunindo toda a documentação comprovatória que esse soro foi produzido dentro das boas práticas de fabricação, seguindo protocolos padrão, a farmacopeia brasileira. Ainda falta submeter o projeto às comissões da Anvisa e Conep. Quando for avaliado testaremos em 30 pacientes e depois em número maior.”

Pesquisas

O professor da Faculdade de Medicina (FMB) médico infectologista Alexandre Naime Barbosa comenta que a participação dele na pesquisa é o desenvolvimento do protocolo da pesquisa em seres humanos. “O soro tem uma história de desenvolvimento muito longa, mais de uma década. Os ensaios que a gente chama de estudos pré-clínicos estão prontos há cerca de dois anos.” Vencida essa fase, que mostra que é possível fazer um soro antiveneno, é que começa a ser testada em seres humanos. “Fui contatado para fazer a transposição desses estudos para seres humanos. No final de 2013, o trabalho foi submetido aos órgãos regulatórios que no Brasil são dois: um que sobre a ética em pesquisa e outro faz a regularização, respectivamente, o Conep e a Anvisa.”

Teste em humano pode não ocorrer

Divulgação

Alexandre Naime Barbosa teve participação no estudo

O médico infectologista Alexandre Naime Barbosa ressalta que o estudo em humanos pode nem acontecer. “Eles acabam matando a pesquisa. Temos um financiamento da Finep, que é um órgão federal de quase R$ 2 milhões para esse projeto. Eu tenho prazos a cumprir. Ou seja, tenho que prestar contas, mas não consigo fazer o estudo. Se o prazo não for obedecido, não há financiamento e o estudo em humanos pode nem acontecer.”

Ele lembra que, caso o soro tivesse sido avaliado e aprovado, estaria disponível. “Temos um estoque do soro pronto para uso em seres humanos. Produto está pronto, se ele funciona ou não ainda não sabemos. Em 99% dos casos de acidentes com abelhas são com as africanizadas. O problema não é levar poucas picadas, mas acima de 200, quando ocorre uma concentração maior de veneno e pode levar a vítima à morte.”

A pessoa atacada por abelhas morre de insuficiência renal, explica o médico. “Um dos componentes do veneno da abelha faz com que o rim pare de funcionar. A abelha africanizada é predominante no Brasil e todo o continente africano e Estados Unidos.”

Botucatu tem serviço de retirada de enxames

A cidade de Botucatu é servida por um serviço de retirada de enxame de abelhas. O trabalho é fruto de uma parceria da Vigilância Ambiental de Saúde e a Unesp de Botucatu. No ano passado foram retiradas 1.239 enxames na área urbana. Deste total 611 eram de abelhas africanizadas e 628 de vespas.

“As vespas são soltas em mata. As abelhas africanizadas são as produtoras de mel e são utilizadas no desenvolvimento de pesquisa então levamos para a Unesp. Mais de 90% dos enxames retirados estavam em área urbana. Na área rural os moradores têm contato com apicultor particular que retiram. As ocorrências são registradas especialmente no período de novembro a março, por conta da florada,” comenta o diretor de Departamento de Planejamento e Serviços de Saúde, Rodrigo Iais da Silva.

Em Botucatu só 3% das solicitações são repassas para o Corpo de Bombeiros. “Quando o local é muito alto e a retirada depende do equipamento de rapel. Especialmente embaixo de viadutos. Temos uma equipe treinada pela Unesp que faz plantão das 13h às 21h. A retirada como é preconizado pelo setor deve ser feita a noite. Período em que parte da população deixa as ruas e o risco de acidente é menor. As abelhas se reúnem a noite dentro da colmeia, porque de dia elas estão polinizando.”

Para fazer a retirada dos enxames, os agentes usam roupas apropriadas e fumegadores. “O equipamento é fornecido pela Secretaria da Saúde. O material de captura, as caixas são fornecidas pelo setor de apicultura da Unesp. Nós levamos as caixas com abelhas. Eles retiram e passam para as caixas deles de cria e produção. Devolvem as caixas prontas para uma próxima retirada.”

Abelhas atacam para proteger o seu espaço

Quioshi Goto

O manuseio das colmeias deve ser feito só por quem conhece. Ferrão libera um odor de hormônio que alerta as demais para protegerem o seu território

As abelhas atacam suas vítimas, animais ou seres humanos sempre que sentem que seu território está ameaçado. O comportamento das abelhas acompanha o dos demais animais, segundo o médico veterinário e especialista no assunto Ricardo Orsi, da Unesp de Botucatu. Ele explica que as abelhas africanizadas, as que temos no Brasil, são conhecidas por terem comportamento extremamente defensivo.

Essa abelha surgiu em 1956 do acasalamento da origem europeia com as africanas. “Esse híbrido predomina em todo o continente americano. O acidente acontece, geralmente, quando alguém por descuido entra no território que as abelhas entendem como necessário de defesa. Elas não são agressivas, agem como qualquer animal que se sente ameaçado.”

As primeiras, ao picarem, chamam as demais pelo odor. “A abelha ferroa (só a fêmea faz isso) a vítima e o deixa na pele do invasor, do qual libera um cheiro de hormônio que atrai outras abelhas que também vão fazer a defesa. É uma forma de potencializar a proteção da colmeia”.

Para ter segurança, o especialista orienta que é preciso manter moradias, criação de animais e estradas a pelo menos 300 metros de distância dos enxames de abelhas africanizadas. “Quando alguém se aproxima do raio de ação de defesa, elas promovem o ataque. Recentemente um homem de 80 anos foi atacado em Botucatu e morreu.”

Para fugir do ataque de abelhas, o melhor é mergulhar em água. Porém, como nem sempre isso é possível, o professor ensina: “Um tecido grosso tipo cobertor pode proteger a vítima. Ele evita que o ferrão entre direto no organismo. Dependendo da quantidade de abelhas, a pessoa pode correr sempre em zigue-zague para que as abelhas se atrapalhem. As abelhas africanizadas perseguem o invasor por até 100 metros.”

Os ataques, ao contrário do que muitos pensam, acontecem em sua maioria na área urbana. “São enxames que estão alojados em casas ou que estão migrando e param para descansar. Tem uma migração muito grande de abelhas por conta da ação do homem que desmata cada vez mais.”

Para retirar o enxame é preciso chamar algum apicultor que tenha conhecimento técnico, orienta Orsi. “Ele retira e leva para o apiário, dando o destino adequado, coloca na colmeia. Jogar veneno mata a abelha, mata um polinizador de grande importância e prejudica a produção de mel, a biodiversidade, além de contaminar ambiente com agroquímico.”

O soro antiveneno desenvolvido em Botucatu neutraliza cerca de 90% dos problemas causados pelas picadas de abelhas africanizadas. O soro é recebido por via intravenosa e cerca de 20 mililitros levam ao organismo uma quantidade de anticorpos capaz de minimizar os efeitos das múltiplas picadas.

Um adulto picado por mais de 200 insetos recebe uma quantidade de veneno suficiente para causar lesões nos rins, fígado e coração, debilitando esses órgãos. A maioria das mortes acontece pela falência dos rins. Durante o verão, quando as altas temperaturas e os temporais são mais comuns, aumenta a probabilidade dos acidentes com abelhas que podem ser fatais. Em 9 de fevereiro, o ataque de abelhas africanizadas levaram à morte um homem que tomou cerca de 300 picadas. Mesmo levado para o hospital da Unesp, ele não resistiu à ação do veneno.

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