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  • Dr. Alexandre Naime Barbosa

A Epidemia de Sífilis: Uma Doença de Fases


Entrevista à Revista da APM, edição de Julho de 2017

Acesse a matéria para download aqui, ou leia abaixo.

INFECÇÃO SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEL – DE PROGRESSÃO LENTA E DE ALTA TAXA DE CONTÁGIO – VOLTA A CRESCER NO BRASIL, COM MAIOR CONCENTRAÇÃO NA REGIÃO SUDESTE; SURTO EPIDÊMICO PODE ESTAR RELACIONADO À NÃO PERCEPÇÃO DE RISCO E À FALTA DE MEDICAMENTO

O termo sífilis foi tirado do poema épico Syphilis, sive morbus gallicus to por Girolamo Fracastoro, médico e escritor e poeta italiano. O gênero literário, produzido em 1530, descreve a moléstia dada por Apolo, deus do Sol, como castigo ao pastor Sífilo, que o insultava. Hoje, a denominação passa bem longe da inspiração artística poética, já que representa uma infecção causada pela bactéria Treponema pallidum – transmitida sexualmente e verticalmente durante a gestação ou parto –, que evolui de forma crônica em períodos de agudização ou latência.

A teoria científica mais difundida reconhece que a patologia é autóctone das Américas, e se propagou pelo mundo após o período de colonização europeia. De lá para cá, especificamente no Brasil, a epidemia tem se repetido mais do que o previsto. Do total absoluto de 227.663 notificações de sífilis adquirada, entre 2010 e junho de 2016, a maior parte dos casos (62,1%) está concentrada na Região Sudeste, segundo o levantamento do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde. Só no estado de São Paulo, de acordo com o Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS -SP, foram 130.461 infecções adquiridas, entre 2007 e 2016.

“É um fenômeno multifatorial e com mecanismos comportamentais e biológicos complexos. Mas esse aumento não é exclusivo do Brasil. A Organização Mundial de Saúde estima entre 6 e 12 milhões o número de pessoas infectadas anualmente pelo Treponema pallidum”, afirma o membro da Sociedade Brasileira de Infectologia, Alexandre Naime Barbosa.

De acordo com ele, a falta de percepção de risco – principalmente entre o público mais jovem – e o aumento no número de contatos sexuais, acompanhado por sua baixa adesão ao uso de preservativo, influenciam de forma significativa na ampliação de contágios. “Além disso, temos uma taxa de infectividade maior em termos de transmissão sexual do que o HIV.”

Para completar o quadro, a falta do principal antibiótico usado no tratamento da doença, a penicilina benzatina, em todo o mundo, afetou o abastecimento nas prateleiras brasileiras, dificultando o acesso da população ao medicamento. “Principalmente no que se refere aos casos de sífilis congênita, pois não há alternativas terapêuticas e de profilaxia para o feto tão eficazes na população de gestantes quanto a famosa Benzetacil”, explica Barbosa.

Evolução da enfermidade

Como sabemos, a sífilis desafia a humanidade há séculos. “É uma doença de evolução lenta. Quando não tratada, alterna períodos sintomáticos e assintomáticos, com características clínicas, imunológicas e histopatológicas distintas”, informa a gerente do serviço de vigilância epidemiológica do Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS, Mariza Vono Tancredi, unidade vinculada à Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo.

O primeiro sintoma é o aparecimento de uma lesão ulcerada em genital masculino e feminino, e em regiões como boca e lábios. Denominada cancro duro ou protossifiloma, é indolor, tem a base endurecida, contém secreção serosa e muitos treponemas. A lesão primária se cura espontaneamente, em um período aproximado de duas semanas.

Quando não tratada, a sífilis evolui para a fase secundária, período em que o treponema já atingiu todos os órgãos e líquidos do corpo. É verificado artralgia, febre, cefaleia, rash cutâneo (presente também em palmas das mãos e plantas dos pés), poliadenopatia regional, alopecia e condiloma plano, entre outros achados.

Após a sífilis secundária, existem dois períodos de latência, geralmente assintomáticos: um recente, com menos de um ano; e outro tardio, com mais de um ano de infecção. Como não apresenta qualquer manifestação clínica, o diagnóstico se dá exclusivamente por testes sorológicos.

Na fase terciária, a doença inflamatória pode afetar qualquer órgão do corpo. “O acometimento mais importante é o do sistema nervoso central, conhecido como neurossífilis, mas outros órgãos como o coração, ossos e fígado são alvos frequentes. Essa forma é a mais grave, potencialmente fatal se não tratada adequadamente”, assevera o membro da SBI. Entretanto, segundo o especialista, alguns indivíduos obtêm cura espontânea ou após o tratamento.

Diagnóstico

Mariza informa que o diagnótisco laboratorial deve levar em consideração a história do paciente, os dados clínicos e a detecção de antígenos ou anticorpos por meio de testes laborais. “Por isso, é importante conhecer a evolução da doença, as diferentes fases da infecção e o que cada teste laboratorial é capaz de detectar para utilizá-los adequadamente”, sustenta.

Os exames sorológicos são realizados em duas etapas: testes treponêmicos (FTAAbs, TPHA ou Teste Rápido) – que avaliam a infecção prévia pelo Treponema pallidum – e testes não treponêmicos tituláveis (VDRL e RPR), usados para seguimento e avaliação da atividade da doença, e também como marcadores de eficácia clínica.

A notificação de sífilis congênita, em gestante e adquirida, é compulsória em todo o território nacional. “Porém, sabemos que essa rotina de reportar os casos suspeitos ou diagnosticados é muito falha em todo o País, e, portanto, a subnotificação contribui para o desconhecimento do real impacto dessa doença na população brasileira”, finaliza Barbosa.

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